A Santíssima Trindade dos mitos gramaticais
1.Voltar atrás. ‘‘É pleonasmo’’, bradam os repetidores de versões. E explicam: ‘‘Voltar só pode ser atrás. Como voltar pra frente?’’
A lógica parece perfeita. Mas há um senão. O verbo voltar só adquire o significado de retroceder se estiver acompanhado do atrás. É diferente do subir pra cima e descer pra baixo. Subir é sempre pra cima. Descer é sempre pra baixo. Mas voltar nem sempre é retroceder.
2.Taxar x tachar. Essa é velha como o rascunho da Bíblia. Desde que o mundo é mundo, repete-se que taxar significa tributar. É meia verdade. A acepção do verbinho vai além. Atrevido, ele avança no território do tachar. Aí, quer dizer avaliar, julgar, qualificar: Taxou a apresentação de perfeita. Taxou-o de ignorante. Taxou o assessor de corrupto. Taxar pode ser avaliar positivamente ou negativamente, enquanto tachar é sempre avaliar negativamente, censurar.
Duvida, criatura sem fé? Banque o São Tomé. Consulte o dicionário. Depois, respire fundo. Você sabe que três coisas não podem falhar. Uma delas: luz na sala de cirurgia. Outra: o amado no encontro amoroso. A última: a correção do pai de todos nós.
3. Não … nenhum. Os inimigos da duplinha apresentam suas razões. Dizem que as duas negativas são redundância. Com agravante: junto, o casal deixa de ser negação. Vira afirmação. A lógica da língua portuguesa não é a mesma da matemática onde menos com menos dá mais.
Falsa verdade. O parzinho é filho legítimo da linguinha nossa de todos os dias. Um dos empregos do nenhum exige a companhia da negativa anterior. Veja: Não há nenhum projeto concluído na área social. Não houve nenhum atentado durante a semana santa. Não é assim uma Brastemp.
Não vi filme nenhum. Fez as gravações sem que nenhum entrevistado o tenha visto.
Conclusão: a língua é um conjunto de possibilidades. A gente pode nadar de braçadas. Basta uma dose de coragem. E ousadia.
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